SOBRE TENDENCIOSIDADE
Quanto a este ponto, antes mesmo de explanar coisa qualquer, eu pergunto: quantos livros, revistas, artigos de jornal, opiniões e teorias vocês já leram em que o objetivo não tenha sido convencer daquilo que ali se professava?! NENHUM! Quantas leituras já encontraram na vida que não precisassem passar pelo crivo de sua crítica pessoal, sob o risco de engolir equívocos e meias-verdades como se de algo de senso se tratasse?! NENHUMA! Quantas obras tiveram acesso a que se vissem obrigados, pela força da evidência, a aceitar e abraçar como verdade inconteste tudo o que nela continha?! NENHUMA! Ou será que não houve porção de TODAS AS QUE JÁ LERAM NA VIDA INTEIRA que julgassem pouco atinente ao senso ou que não parecesse a vocês de total solidez a ponto de abraçarem-na na íntegra?! – eu respondo: TODAS!
Difícil é haver concordância plena entre as idéias de dois seres humanos, que se dirá de não primarem pelo convencimento um do outro, quanto àquilo que sinceramente cada um julga estar certo.
Certa vez, encontrei com um amigo muito religioso (no sentido institucional do termo, de abraçar a uma religião institucionalizada e de forma total), o qual, percebendo "os rumos que andei tomando", tentava "conseguir-me a salvação". No começo fiquei irado. Discutimos muito. Mas o que pude perceber pouco depois, à medida que a conversa prosseguia, foi que aquilo era motivado por um desejo sincero de, segundo a sua visão e perspectiva, querer o bem de um amigo, de alguém a quem se prezava e a quem se queria o melhor – ainda que o melhor segundo sua concepção de melhor.
O que pergunto de verdade (sim, porque às demais perguntas acima pus respostas prontas talvez para atiçar) é o seguinte:
É POSSÍVEL ENCONTRAR SINCERIDADE E DESPRENDIMENTO NUM LIVRO, NUMA OBRA QUALQUER, NUM ARTIGO (AINDA QUE CIENTÍFICO), NUM DIÁLOGO ENTRE DUAS PESSOAS, OU HÁ SEMPRE NISSO UMA TENTATIVA DE CONVENCIMENTO VELADA - AINDA QUE MOVIDA PELO SINCERO DESEJO DE DESPERTAR O OUTRO PARA UMA VISÃO QUE JULGA BOA, PROMISSORA, MAIS AMPLA, MAIS ABERTA, MELHOR – MESMO QUE SEGUNDO O JULGAMENTO DE QUEM A FAÇA? E AINDA SE – NESTE CONTEXTO – PODEMOS CONDENAR LIVRO, OBRA OU AMIGO QUE NOS QUEIRA CONVENCER, QUANDO DAQUILO QUE NOS QUER CONVENCER É – SEGUNDO VEJA – PARA O NOSSO BEM?
Como diria um amigo meu, os livros de matemática são os mais tendenciosos do mundo, a simples discordância já faz pressupor daquele que discorda – de antemão – esteja errado, equivocado.
Pensemos.
FRANCISCO DE SOUSA VIEIRA FILHO
4 comentários:
Excelente texto.
O que faz de mim um escritor feliz senão a possibilidade de ver os meus textos aceitos e sentir a opinião dos meus leitores em comunhão com aquilo que escrevo, demonstrando, dessa forma, a concretização da minha verdade, exposta naquilo que escrevo? A necessidade de convencer, a presença do convencimento está - penso eu - exatamente nessa perspectiva de encontrar naquele que lê palavras de confirmação (parabéns, é isto aí, concordo com você...)
Ótima oportunidade para a nossa reflexão, quanto à verdade do outro e a nossa verdade. Seja escrevendo, lendo ou nos relacionando com as pessoas.
Parabéns, mais uma vez, e muito obrigada por oportunizar tal leitura. (Convenceu-me rsrsrs)
Abraços.
Penso que todo texto tem a tentativa de convencimento assim como todo diálogo. Mesmo sem perceber queremos que concordem conosco, há uma sensação liberada que nos faz sentir até melhor com isso.
Excelente seu texto, Francisco,muito reflexivo.
Obrigada pela colaboração e continuemos...
Beijos.
A vida é um oceano de conveniências. A mãe se põe a ninar o filho, pensando no próprio sono, já disse Kallil Gibran. Os oradores, leiam-se pastores, políticos, professores e outros argumentativos (quando chegam a sê-lo), antes de qualquer proveito extraído na mensagem, preocupam-se com a beleza da 'retórica engrandecedora'. A dominação é algo inato ao ser humano, e a palavra, é uma de suas formas.
Belo texto.
Um abraço!
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