O Equilíbrio da Vida (TAO)


O excesso de luz cega a vista.


O excesso de som ensurdece o ouvido.

Condimentos em demais estragam o gosto.

O ímpeto das paixões perturba o coração.

A cobiça do impossível destrói a ética.

Por isso, o sábio em sua alma

Determina a medida de cada coisa.

Todas as coisas visíveis lhe são apenas

Setas que apontam para o Invisível.



(Tao-Te King, Lao-Tsé)




domingo, 25 de novembro de 2012

DURAS LINHAS SÃO AS LINHAS





O pombo se assustou comigo

A glória de escrever bateu asas com ele

Se escrever é versejar, sombrio é não versejar

Não está vindo nada na minha cabeça

A poesia por vezes bate asas como o pombo

Mergulha no ostracismo das contas a pagar

Finca de canivete na madeira mole do acaso

Tanto risca que me confunde inteira

Traços borrados na indecisão do vir a ser

Ontem comecei a escrever algo e não acabei

Tem dias que dá certo, tem dias que não dá certo

Mas tem mesmo esses dias em que a poesia voa

Como o pombo que se assustou comigo.


IANÊ MELLO E BETO PALAIO


*
Pintura: Nicola Slattery - Caçando o pombo - 2011

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

POEMA PARA MÁRCIO RUFINO




Belo Ford roxo
ventava enquanto corria
poesia de faróis acesos
Como pode
a letra viva
viver longe
do livro frio?

Fanzines por conta própria
cantos contos anedotas
onde a poesia frutifica

A vida é seca
no passeio público, Poema
arde o pó das rimas
se inclina o fino menino

Rufos de asas finas
vôos de Curupira
verbo solto na Baixada

Tantã de tambores
num alto brado
de humana resistência
biscoitos à meia-noite

Palavras soltas ao vento
mesclam-se à poeira
a terna voz de Rufino


IANÊ MELLO E BETO PALAIO

*

Foto de Marcio Rufino

terça-feira, 20 de novembro de 2012

A biblioteca de Alexandria (Dos antepassados)




A chama consome a ponta do Papel...

O Tempo não é mais um deus.

RODRIGO DELLA SANTINA

Agonia




Nervosismo
Girando
No estômago
Sufocando
A vida
Que há dentro
De mim

RODRIGO DELLA SANTINA

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

AFLORAÇÃO






Voam cores no arrebol
dilúvio de tons arredios
afogamentos de luzes ardentes
nuvens que pintam em artifícios.

Por onde vamos nós?
amantes de rumores vastos
pecadores em caminhos aflitos
Bacantes em desejos afins.

Fecha-se a porta da formosura
o tempo corre incógnito e ligeiro
sonhos abundantes já rareiam
momentos tão queridos se esvaecem.

Para onde vamos nós?
navegando afluentes do sagrado
redes de densos ocultamentos
desencantos em caminhos afortunados.

Floreiam nos jardins flores outonais
no tempo que corre sem favor
deixando vestígios nos rostos maduros
nos corpos vividos apenas cansaço.

Para onde vamos nós?
correndo contra o tempo
enganando nosso sentir
Iludidos por uma vida fugaz.


BETO PALAIO E IANÊ MELLO

*
Pintura: Aquarela de Emil Nolde

Há uma chuva indecisa lá fora



Há uma chuva indecisa lá fora

Brava às vezes
Às vezes tenra

Deixo que mordisque minhas costas
Enquanto me curvo sobre um livro antigo

Na cozinha
O perfume do café nascendo
Numa tarde pacífica de Agosto



Os Deuses dormem

RODRIGO DELLA SANTINA

sábado, 6 de outubro de 2012

Dueto




Na espera, as mãos não dançam

*

Então,
Os trilhos
(Cordas desafinadas de um violoncelo)

É hora.

Abraçam-se. Beijam-se.
Infinitamente

Súbito,

                              Desenlace

RODRIGO DELLA SANTINA

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

A brincadeira




...uma borboleta faz cócegas no vento
O céu sorri como um pai orgulhoso

É de tarde.
Daqui de baixo
Eu vejo a brincadeira

— Parecem felizes

RODRIGO DELLA SANTINA

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Chuva Fina




Chuva Fina
Massageia-me o rosto
Parece tinta
Escorrendo na tela
Traz consigo, e dá-mo a mim,
O frio sem Forma

RODRIGO DELLA SANTINA

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Consoada




Quando a Inoportuna chegar
(por que tarda?)
Cruzarei calmamente as pernas — num gesto de desespero
(Tudo fora do lugar devidamente)
Tomarei um gole de vinho
E relatarei, como manda a etiqueta,
Toda a minha vida
Ficará entediada
Mas sua inconveniência, apenas um artifício.
Quer que eu pergunte:

— Por que tardou?

RODRIGO DELLA SANTINA

sábado, 22 de setembro de 2012

Luz e sombra




Frenéticas, opostas, se entrelaçam
A luz e a escuridão num só recinto...
Ao mesmo tempo acolhem e rechaçam
Os pudores que vão lhes consumindo...

RODRIGO DELLA SANTINA

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Estremecimento




É da minha personalidade provém da minha alma
Essa pedra que agita a água parada que sou.
Agita, mas para nada
Pois (como a água) não me desloco

                                        — Me desequilibro

RODRIGO DELLA SANTINA

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Revelação




Rubra
Como o ocaso
&
Dura
Como o silêncio
He
A lágrima que morre
Junto ao soluço estrangulado

RODRIGO DELLA SANTINA

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Diálogo Poético : Ianê Mello e Beto Palaio



PRAZER SOLITÁRIO


Em meio à espuma e risos de sabonete
eis a aprendiz de sereia distraída
nas travessuras do banho submissa
bela oferenda em curvas tentadoras

Na água que escorre em seu corpo desnudo
em suaves carícias a deslizar promessas
a fluir em sentidos despertos brandamente
mulher que se descobre e se desvela

Breves anotações de pingos
fugas delicadas na pele nua
plenitude de astros misteriosos
relâmpagos na carne traslúcida

A oferta do amor em solidão
escorre a água em comunhão
seu corpo arde sob a ducha
em completa entrega ao prazer

O gozo se anuncia num breve espasmo
no corpo que se contrai ao desejo latente
enquanto a água flui morna e indiferente
aos seus desejos plenamente saciados


IANÊ MELLO E BETO PALAIO

(14.09.12)

 *
Pintura de Niceas Romeo Zanchett

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Não há tempo




Não há tempo para dores inexpressivas
Não há tempo para canções altruístas
Não há tempo, nem espaço, para ideias a vapor
Não há tempo para rimas espelhadas
Acentos sonorosos linhas rejuvenescidas
Não há tempo para cortes educados nem cortes anarquistas
Não há tempo para sons geométricos perfeitos que não sejam
          [provenientes da íntima significação do verbo ser.

(O tempo é para mãos fortes
Talhadas no asfalto
Nos girassóis da ciência nos odores da tecnologia
No trono do Universo
O tempo é para olhos velhos de simplicidade
Para almas cândidas de versos).

Não há tempo para dores obscuras.
Há tempo para o Homem primitivo, no sentido mais original da
                                                                                                       [palavra.

RODRIGO DELLA SANTINA

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Diálogo Poético: Beto Palaio e Ianê Mello





UNIVERSOS PARALELOS


Noite e dia correm lado a lado
durmo com a noite do lado de fora
acordo com o dia entre travesseiros
ao meu lado desperta a inteira natureza
sentindo seu perfume eu me perco
em campos, florestas, flores convidativas

Anoitecemos em noites de desejos despertos
em carícias que emolduram sentires
Amanhecemos em manhãs de sóis dourados
a brilhar nos corpos nus a descoberto
em cheiros de almíscares e jasmim
jardins de delícias em campo aberto

Madrugamos enlaçados no mesmo pulsar
nossos corações são o centro de uma galáxia
a lide do amor nos embala a inventar mundos
contigo flutuo ao infinito sem que nos percamos
breve os nossos lençóis imitam tapetes voadores
somos um só desejo e dormitamos eternidades

Noite e dia correm lado a lado
em nossa cama desfeita pelo mais puro deleite
em nosso querer sem tréguas
em corpos que se aprazem sem cansaço
no universo a nossos pés submisso
onde lua e sol conversam amorosamente


Beto Palaio e Ianê Mello


*
Pintura de Leonid Afremov

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Dialogo Poético : Ianê Mello e Beto Palaio




A POESIA DA POESIA


Te encontro ao acaso após muita busca
a musa que canta seus domínios me guia
Encontro furtivo em noite de lua
acende a chama que invade o querer

Num círculo de entendimentos consentidos
pensamentos que esmaecem toda prosa
Na correnteza de sentires estreitam-se laços
fina sintonia que abarca amantes

A inteireza natural que convida o adormecer
Céu que sabe iludir em nuvens passageiras
Em encantos gorjeiam pássaros multicoloridos
nos abraços que perduram em amores fartos

Flores e faces competem em deslumbramento
espelhos que refletem palavras que escorrem
Natureza em contornos e doces sombreados
no amor que se propaga em versos divididos


IANÊ MELLO E BETO PALAIO

*
Pintura de Marc Chagall

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Dialogo Poético : IANÊ MELLO E BETO PALAIO



POEMA PERDIDO


No fundo do poço
em sonhos dormentes
perdido no imaginar
na sede que cega
a fonte inteira adormece.

O fogo da saliva
em beijos jamais esquecidos
ensaio de línguas
onde o espelho é romance
na faca o corte.

O batom no guardanapo
no cio o desejo
mãos tateiam inalcançáveis
com um gosto de sal
momentos dispersos ao nunca mais.

Volúpia de amores gris
mergulham em viagem desconhecida
emaranhados em teias
ao sorver horas infindas
na tessitura da carne que fraqueja.


IANÊ MELLO E BETO PALAIO

(10.09.12)

*

Pintura de David Jay Spyker.

Diálogo Poético : Ianê Mello e Beto Palaio




BELEZA IMPAR



arrimo de lindeza
lide de rimas
rito de linhas
uva de rios
luva de fios
silvo de rainhas 
ponta de saliva 
belina na neblina
corda que afina
ganas de bailar
mar de havana
raiz fincada
areias penteadas
lenha parideira
fome vencida
nome aparecido
veias destronadas
grelha resfriada
amor de repente
fogo de acender
cortina de fumaça
olhos de mirar
boca de beijar
sentir que aflora
tempo que demora
vontade de ficar
ondas de arrebentar
mares de nadar
corpos de flutuar
desejo saciado
loucura desavisada
mente deturpada
anseios de voar
cama de armar
rede de amar
vontade insana
corpos mútuos
açude todo mar
flor desabrochada
ternura arraigada
sede de viver
tremores abrandados
luto ensaiado
coração a bater
amor de se entreter.



IANÊ MELLO E BETO PALAIO
*
Ilustração de autoria desconhecida.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Diálogo Poético: Adelia Prado e Ianê Mello




O VESTIDO 


No armário do meu quarto
escondo de tempo e traça meu vestido
estampado em fundo preto.

É de seda macia desenhada em campânulas
vermelhas à ponta de longas hastes delicadas.
Eu o quis com paixão e o vesti como um rito,
meu vestido de amante.

Ficou meu cheiro nele, meu sonho, meu corpo ido.
É só tocá-lo, volatiza-se a memória guardada:
eu estou no cinema e deixo que segurem minha mão.
De tempo e traça meu vestido me guarda.

ADÉLIA PRADO



VESTIDO EM TRANSPARENTE


Em meu vestido rendado
de seda e de paixão
escondo um amor guardado
um amor em erupção

Amor vermelho encarnado
formosa rosa em botão
ao toque tão delicado
da maciez de tua mão

Nele meu corpo e desejo
escondem-se do tempo passado
e ao vesti-lo, num lampejo
mantenho o sonho acordado

Ainda guarda a transparência
que na fina seda se aninha
do perfume sua essência
delicadeza inteirinha minha.


IANÊ MELLO

*
Pintura de Michael Austin




Diálogo Poético: Ianê Mello e Joaquim Vale Cruz



(A)MARES


Em profundezas
adentro

imenso
imersa...

Mar-Cio

seu nome
sal e areia

enlaço versos
despida

a alma
branca espuma

no mar
do (a)mar

mar(po)esia


Ianê Mello


(06.09.12)


Em profundezas adentro
(A)mares em que me concentro
Imerso num tal sentimento
tão imenso como o firmamento
É mar, é cio
é um arrepio
é sal, é areia
com que me enleia
Seu nome em versos enlaço
e se está despida, o que é que eu faço ?
a alma transformo em espuma macia
em mar de (A)mar, mar de poesia…


Joaquim Valle Cruz


* Pintura de Salvador Dali

Diálogo Poético: Ianê Mello e Beto Palaio




ODE AO IMENSO AMOR



A minha língua plana
em sua língua insana
desejos intumescidos
perdidos em amores febris.


A volúpia lentamente se apossa
e você de mim se apodera
em lânguida entrega me desfaço
na fluidez do gozo que se alastra.


Sentidos dispersos ao amor
em meia-voz ao seu ouvido proclamo
frases desconexas em voz tremula
ao êxtase inadiável deste amor insano.


Na noite que se despede mansa
derramo-me na paz de lençóis silentes
enlaçados corpos em doce sono
paixões adormecidas em abandono.



IANÊ MELLO E BETO PALAIO

*

FOTOGRAFIA DE MAN RAY.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Eu, Epimeteu acorrentado




Ó magna corrente! Ó sublime ferro,
Que trava relações com minha carne!
Ó sangue abençoado, que a forjar
Me está a alma para este Novo Império!

Eu vos invoco! Vede quão sincero
E justo é o meu tormento, como arde
Em mim o Fogo (aceso, a crepitar)
De eras remotas, de hoje e dos Mistérios!

Império, ó divino Império, tábua
De Liçoens, muro redemptório, báculo
De fé, deixa-me preso a este rochedo!

Guarda-me ao Pensamento, à Voz! Guarda
Todas as Cores e todos os Sons!
Dize-me da Sorte, como um Oráculo!

RODRIGO DELLA SANTINA

domingo, 2 de setembro de 2012

Diálogo Poético : Adélia Prado e Ianê Mello




O SONHO


O sonho encheu a noite
Extravasou pro meu dia
Encheu minha vida
E é dele que eu vou viver
Porque sonho não morre.


ADÉLIA PRADO

ConVersando com Adélia Prado.



Sigo sonhando sonhos
amores enternecidos
sem abandonos
asas de pássaro branco
numa bela manhã de outono.


Ianê Mello

*
Pintura: Phyllis Barnard

Dialogo Poético : Ianê Mello e Joaquim Vale Cruz





O REVERSO DO CORTE


Assim a pele roça a carne nua
exposta a feridas entreabertas
Não há rosas sem espinhos
e fere a rigidez no amor que cala

fluído que escorre sem sutura
vermelho sangue
corte profundo
marcas indizíveis

na fenda de desejos  obscenos
a carne é fraca e cede
 a sede que devora
a garganta seca

as mãos que anseiam ávidas
sem demora
encontram seu conforto
no colo que as acolhe

o corpo se encolhe
em lânguidos prazeres
no vértice entre as pernas
perde-se em  delícias


Ianê Mello


(02.09.12)


A carne nua em ferida entreaberta
é sonho doce, que logo o amor desperta
e a rigidez que essa sensação nos traz
desperta desejo obsceno que tanto satisfaz

Então a fenda aberta que escorre sem sutura
rosa, vermelho sangue, que o tesão apura
em seu corte profundo de marcas de prazer
torna a carne fraca em terno enlanguescer

E a sede que devora nossa seca garganta
encontra seu conforto e o pudor suplanta
e as mãos que ávidas anseiam, sofrem na demora
aguardam os afagos, que o outro amante implora

É então que o corpo em lânguidos prazeres se encolhe
e no vértice entre as pernas o cetro flamejante acolhe
Porque os dois felizes amantes inventam tais delícias
e em expressões vibrantes se perdem em carícias


Joaquim Valle Cruz
- 2012-09-02


Pintura de Salvador Dali

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Liberdade




Acordo (ainda é noite) na escureza
Do quarto e vou às cegas procurando
A maçaneta, no tempo quando
Numa barra de ferro acerto a testa.

Com sono, dolorido, sem contexto,
Caio, bunda no chão, imaginando
Que diabos uma grade atravessando
Faz o meu quarto, como eu fosse preso.

Procuro o interruptor; e quando o encontro
Aperto-o e luzes vêm de todo canto.
’Stou dentro de uma jaula, qual cobaia.

Fora, a me cingir, há três homens brancos,
Sem faces, ansiosos, como santos,
’Sperando que a Loucura de mim saia.

RODRIGO DELLA SANTINA

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Dialogo Poético : Ianê Mello e Beto Palaio





A ESCOLHA DE ALICE

Alice, Alice, Alice
dorme em teu sono
de menina
em tua inocência
sobrevivem teus desejos

Alice, Alice, Alice
o mundo é obscuro
cheio de perigos
portas ocultas
fantasmas do medo

Alice, Alice, Alice
guarda teu segredo
nesses olhos de sonhar
teu encanto nesse canto
que te embala ao dormir

Alice, Alice, Alice
no mundo real não há lugar
para o Chapeleiro Maluco
para a Lagarta Azul
para o Coelho Branco

Alice, acorda e escuta
depois volta adormecer
se assim preferir, linda menina

Aqui tem Rainha de Copas...
corre Alice, corre!!!!


Ianê Mello


ALICE EM TUDO


Alice nos prados
flor que ri de tudo
cor no perfume
perfume na cor

Riacho-alice
corredeira-alice
queda d´água-alice

Alice no céu
nuvem que tudo vê
a Terra tão longe
o longe tão Terra

Granito-alice
moinho-alice
farinha-alice

Alice no espelho
aluna das miragens
tão rebelde ao novo
ao novo tão submissa

Papel-alice
tinteiro-alice
palavra-alice


BETO PALAIO

*

Ilustração de autoria desconhecida

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Dialogo Poético: Eduardo Ramos e Ianê Mello




MARIA

quem olha Maria
tua imagem semi-oculta
não sabe da dor
não sabe da cor animal
das tuas entranhas...

olho teus olhos sangrando
sem lágrimas humanas
sequer de solidão
para chorar...

olho teu corpo lindo
que pensaste te dar todo o gozo
todo o céu
todo o amor
que buscas em tanto desespero...

olho para ti Maria
a pedra imensa que carregas
as perguntas irrespondíveis
as respostas sem nexo...

ah!... Maria!...
Maria linda
Maria nua
Maria crua
Maria de todos os nomes
todas as dores
todas as cores...

Maria em que explodem tantas e tantas sensações...

deita teu regaço em meu colo,
Maria...
chora teu choro em meus braços de amor!

Deixa, Maria!...
deixa eu inundar tua vida
do que sonhas
do que buscas
do que sabes cessar toda a dor...

Deixa eu cometer o amor
em ti,
Maria....


Eduardo Ramos

( 24-08-2012)


SIMPLESMENTE MARIA

Maria, teu nome é doce
lânguido teu corpo
 aveludado e alvo

Maria  virgem
Virgem Maria

Maria de ninguém

Maria das Dores
de todas as dores
... do mundo
Maria de amores

Maria Auxiliadora
de largo regaço
de mãos que acalentam
mãos curadoras

Maria poço profundo
útero de mãe parideira
Maria a primeira,
única e insubstituível

Maria, esposa e mãe
Maria fonte fecunda

Maria só
Maria vadia

Maria
imensa solidão
em noites longas
na cama vazia

Maria ternura
Maria poesia

Maria
simplesmente Maria.


Ianê Mello


(24.08.12)


*Pintura de Salvador Dali.

Dialogo Poético: Beto Palaio e Ianê Mello





O DESPOTISMO


Mãos do amor em ausência
cirrose clandestina de afetos
fatos que semeiam discórdias
medo de perder, já perdendo.

Distorcido o real
que no imaginário se perde
tecendo tramas e urdiduras
alimentando dissabores vãos.

Rogos que se apagam em sigilo
O destino em peregrinar extremo
cisnes domesticados na jaula
Narciso na tirania do espelho.

Serpente enrodilhada a espreita
preparando o bote fatal
e a vítima sequer suspeita
desse veneno mortal


BETO PALAIO E IANÊ MELLO

*

Pintura de Pablo Picasso “Minotaure”

Dialogo Poético : Beto Palaio e Ianê Mello





VOCÊ NÓS DOIS


Você nós dois
parceiros na vida
uníssonos no verbo
cutucamos feridas
dos mendigantes
de um afeto barato
de noites insones.

Você nós dois
pessoas felizes
quase insuportáveis
ingênuos e alegres
bastante intragáveis
aliás, estraga prazeres
dos tais descontentes.

Você nós dois
inquietudes no olhar
mãos de acalento
vislumbres de ser
inesgotáveis sentires
na distância tão sentida
danças de sonhos
amantes possíveis.

Você nós dois
tomados pelas palavras
almas destorturadas
indo sempre em frente
florescentes como Ravel
em seu Bolero contínuo
esperançosos por sermos
felizes, apenas felizes.


IANÊ MELLO E BETO PALAIO

*

Pintura de D. Hurd.

Dialogo Poético : Beto Palaio e Ianê Mello




SE NÃO POSSO MAIS CANTAR

Se não posso mais cantar
de que vale o céu azul
e o sol sempre a brilhar?
de que serve o pulsar do coração
e as noites de ameno luar?

Se não posso mais cantar
de que vale esse olhar infindo
e as mãos soltas no ar?
de que serve o intenso sentir
e as estrelas a cintilar?

Se não posso mais cantar
de que vale as conchas vidradas
e o mar viveiro de vagas?
de que vale os sonhos de verão
nos compassos da melodia que se apaga?

Se não posso mais cantar
de que vale o sorriso perdido
e a onda a beijar meus pés?
de que vale a primavera
em flores despetaladas ao chão?

Se não posso mais cantar
de que vale a canção no jogral dos rios
e o assoviar das areias nas dunas?
de que vale as doces horas
da rosa que se abre em pétalas?
de que vale o rio sem mar
se eu não posso mais cantar?


BETO PALAIO E IANÊ MELLO

*
  Pintura de Felix Mas

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Dialogo Poético: Beto Palaio e Ianê Mello





AMOR, SEMPRE O AMOR


Viver dançar amar: ou um ramo da solidão a dois, ou um incesto de amor dolorido, ou sonhos de um tango doce e rasgado...

Amor que arde nas entranhas
amor cavalgado em noites sem dormir
amor colorido em arrebóis
amor desbravado entre os lençóis

Desleixo desejos arrepios: ou um estremecimento ardente, ou um suspirar em entregas, ou um arremate em gozo...

Arrepios em pelos fartos
adocicados sabores
gotejares úmidos
fluidos em sentires

Amor finito apaixonado: ou o final de um ato sagrado, ou a paz de guerreiros insanos, ou o inicio de um recomeço...

Urdiduras em teias
emaranhados em nós
tecituras amanhecidas
em auroras douradas de sóis

Lágrima paixão dor: ou respingos de néctar sorvido, ou regato de lágrimas no anseio, ou ponta de plenitude no estio...

Nevascas intempestivas
em cruezas de dúvidas esquecidas
resgates em mar bravio
corpos ilhados no azul

Romance paz languidez: ou desejos plenamente atendidos, ou sono que enrodilha e cega, ou despertar de corpos enlaçados...

Na manhã que descortina
prazeres saciados
em nesgas de sol por entre as frestas
nas paredes do quarto amarelecidas

Confissão despropósito recomeço: ou o duplo criador enrodilhado, ou as mãos que descansam na procura, ou o despertar insaciável da véspera...

Zen, bem, meditativo êxtase
silêncios improrrogáveis
em palavras que despertam
no amor que explode em versos


Beto Palaio e Ianê Mello


*
Pintura de Wladimir Kush


sábado, 18 de agosto de 2012

Dialogo Poético : Beto Palaio e Ianê Mello




EU EM SEUS BRAÇOS


Desapareço em seus braços
que se tornam estradas
silenciosos caminhos do amor

Num terno abraço me acalenta
sonhos que adormecem
enquanto a noite tece sua teia

Cavalgamos a colher amoras
beijos de veludos rubros
desejos tintos de vinho

Inebriados sentidos despertos
o amor que se assenta em delícias
perdidos um no outro adormecemos


Beto Palaio e Ianê Mello

*

Pintura de Toulouse Lautrec  “In bed the Kiss”

segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Dialogo Poético : Ianê Mello e Hildebrando Menezes




AMÁLGAMA


Num dialeto inventado
em palavras vacilantes
O ato se fez encantado
Sublime sussurro pulsante

Murmúrios de amor

Nela ele se perdia
e nela se reencontrava
A veia reacendia
O que tanto procurava

Em rasgos de ternura abrandados

O contato amalgamava
Em nesgas de paixões acalentadas
Dois seres vibravam
Almas apaixonadas

Em vícios e venenos que embriagam

Nela ele se afogava
Nada os separava
Em braços e pernas
Tudo os interligava

Pele e pelos

Em cheiros de almíscares e jasmim
Doçuras e delícias
Eu e você... Assim!
Em suores e carícias

Quando a noite invadia a tarde

Sonhos e desejos satisfeitos
Até perder-se de si mesmo
Dois seres plenos e repletos
Amalgamados a esmo

Até não ter mais juízo

Até liquefazer-se de amor
Fusos e difusos
Na fusão dos corpos úmidos
Só a ternura mais profusa

No calor que abrasa e queima

Na vida que nasce e morre
Na profusão das chamas
Tórrida paixão que inflama
Fenece, eleva, transparece

e novamente renasce.


Duo: Ianê Mello e Hildebrando Menezes


*

Pintura de autoria desconhecida

domingo, 12 de agosto de 2012

Trovoada



Como é triste o retumbar das vozes
Que num círculo mudo
Silencia
As próprias pegadas

RODRIGO DELLA SANTINA

sábado, 11 de agosto de 2012

Dialogo Poético: Beto Palaio e Ianê Mello




DECLARAÇÃO À MEU PAI



Óbvio, puramente óbvio
óbvio como as pupilas habitam os olhos
ou como os dedos são hospedes das mãos
óbvio que gostaria de falar contigo
num abrir e fechar de portas
mesmo sem te encontrar de fato
óbvio que te procuro imensamente
neste corredor discursivo, a vida
por onde desfilam todas as coisas
onde tudo gira tão alegremente
neste carrossel de fatos constantes
mas que um dia desafiarão o existir
pai, aqui quero te reencontrar

Simples, extremamente simples
um querer que ultrapassa o tempo
onde vida e morte são um mero detalhe
uma saudade apertada contra o peito
de um abraço sincero e do calor de suas mãos...macias
simples assim, esse amor infinito de doer que cala a fala que emudece a boca que transpassa o sentidos
onde tudo o que era luz escuro se torna
onde tudo em que era brilho escureceu feito noite sem lua
nessa terra de ninguém onde você importa
quando dois braços fortes te enlaçam com ternura
pai, sigo sempre a sua procura

Dor, imensamente dor
doía um sono em teus olhos
dessa dor que em nós é viagem
eu estava tão distante de ti
no tudo que nos habita
num tumultuado dia comum
o tudo me quedou extravagante
o sol que insistia em habitar a pele
mais que num dia comum
quando a água já não sacia a sede
e o correr das horas nos carrega
nos braços de uma eternidade fria
neste dia quis te dizer algo
um detalhe apenas, tão ínfimo
mas que não disse, nem deu tempo
disso que na despedida é oculto
em separar o que pensamos sem fim.

Amor, só  esse sentir me restou
do triste adeus de tua partida
em meus olhos marejados sem sequer a despedida
no despedaçar lento em meu peito ancorado
tu eras meu porto seguro, eu tua princesa encantada
que numa redoma de vidro guardavas com zelo
amor, sim, amor, era o que sentias ao fazê-lo, bem sei
para manter-me junto a ti, meu rei
filha amada até o fim de teus dias
agora jaz a perda na saudade ingrata
que inda teima em latejar, ferida entreaberta
tu eras meu precioso tesouro e eu não sabia
o que tua ausência resgata em mim
enquanto de mim mesma me perdia
e me reequilíbrio na corda bamba
na vida da qual me resguardavas por amar demais



Beto Palaio e Ianê Mello


Pai - Fabio Jr.

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